sexta-feira, maio 06, 2022

Considerações sobre Perícia Grafotécnica.

Primordialmente, é importante esclarecer que em que pese seja aplicado para fins civis, a grafoscopia se relaciona em origem a estudos criminalísticos, tendo como objetivo a verificação da autenticidade ou falsidade documental, bem como autoria assinatura firmada em documentos. O expert nessa seara, portanto, lança mão de conhecimentos científicos para identificar eventuais fraudes em documentos, mormente, em relação a assinaturas firmadas neles.

Aqui, outro esclarecimento que é, desde já, importante: Ainda que em algumas leituras seja previsto o estabelecimento de diferenças entre grafoscopia e grafotécnica, optamos por nos aliar a corrente dominante e tratar ambas as terminologias como sinônimas.

Picha Filho (2016) leciona que a grafoscopia está inserida na documentoscopia, que por sua vez se insere no universo das ciências forenses que compõe o estudo da criminologia, em que pese a aplicação da perícia grafoscópica dentro e fora do Direito. Esta ciência tem por finalidade precípua, a partir de análise do confronto, detectar a autenticidade de uma assinatura ou rubrica.


1- Procedimentos da Perícia Grafotécnica

O rigor técnico seguido nesta perícia ausenta o profissional grafotécnico qualquer manifestação de parcialidade, afastando assim qualquer convicção prévia a respeito do objeto periciado. A metodologia empregada promove a primazia dos procedimentos em cada exame. E, a partir de uma severa observância das leis e técnicas consagradas na ciência grafotécnica, o perito será conduzido ao resultado pretendido.

Convém destacar que os exames efetuados na perícia devem obedecer os limites impostos pela metodologia aplicada à investigação. Podem vir a ser objeto da investigação questões externas que podem alterar a escrita, como fatores térmicos tais como frio e calor; fatores emocionais e psicológicos, como alegria ou tristeza ou fatores de habilidade e instrução de escolaridade e fatores etários, como a senilidade. Contudo, jamais é permitido ao perito fazer juízo de valor, inferências ou julgamentos alheias a técnica estabelecida.

Dessa forma, a perícia se debruça especificamente em verificar a escrita a partir de um minucioso cotejo entre os elementos gráficos lançados nas peças questionadas e confrontadas.

Destarte, recomenda-se que a perícia os siga os procedimentos aqui enumerados:

  • Inspeção prévia ocular do documento questionado para apreciação de seus aspectos gerais;
  • Minuciosos exames das peças questionadas para a determinação de suas características;
  • Cotejo entre peças questionadas e os padrões de confronto, com anotação e interpretação de suas convergências e divergências, conforme a metodologia pericial grafoscópica;
  • Execução de imagens digitalizadas ilustrativas, com utilização de recursos de informática;
  • Coordenação de todos os dados técnicos apurados;
  • Redação final e montagem do laudo.


2- A evolução das metodologias aplicadas à grafotécnica

A evolução da análise grafotécnica se observa a partir da evolução da metodologia aplicada na prática da grafotécnica. Tirotti (2021, p.9) leciona que ao longo da história, alguns métodos foram abandonados por serem notadamente ineficientes. Porém, outros são aplicados até os dias atuais e acabam por completar um outro método mais avançado, mais sofisticado e com um maior caráter cientifico. Destacamos:

O Método Morfológico inaugura a ciência da grafotécnica e consiste na análise meramente formal. A conclusão parte do confronto de letra por letra no sentido de levantar a estatística entre convergências e divergências entre elas. Havendo um predomínio de convergências, de acordo com este método, é permitido compreender que o registro gráfico questionado é oriundo do mesmo punho do registro confrontado.

Também conhecido como método de Bertillon, a aplicação do método morfológico permitiu uma série de graves erros judiciais, como o caso do oficial francês Dreyfus falsamente de passar informações para o exército alemão.

Já, o Método Grafológico surgiu na escola francesa de Crepieux-Jasmim e pode ser compreendido como um aperfeiçoamento do Método Morfológico, uma vez que ele direciona maior atenção aos elementos subjetivos do grafismo, tais como: dimensão; direção; forma; ordem; pressão; continuidade e velocidade e também busca decifrar traços de personalidade, morais e intelectuais do escritor. Dessa vemos um protagonismo das formas e dos elementos subjetivos, que além de revelar sobre a conduta moral do escritor são de difícil disfarce por falsários.

Com o evoluir da ciência grafotécnica, o francês autor do tratado de criminalística Edmond Locard inovou com o método grafométrico em colocar como fatores determinantes as ‘grandezas da escrita’, com a tese de que as características de proporcionalidade e calibre são invariáveis. Apesar de uma importante contribuição, este método não é aplicado na praxe grafotécnica, pois demanda uma quantidade excessiva de texto para confronto.

O italiano Ottolengui tomou por base o Método Morfológico de Bertillon, individualizando valores da escrita para depois seguir com o confronto. Porém, negligenciou no sentido de não valorar os elementos subjetivos que a escola francesa tanto colocou em evidência, como fator de identificação do traço gráfico. A partir da falha nesse método, ficou definitivamente entendido que a grafotécnica não é constituída por elementos quantitativos, mas a pela junção de elementos quantitativos e qualitativos.


3- O Método Grafocinético


Apesar de sua inviabilidade, o método sinalético de Ottolengui serviu para superar a celeuma entre elementos qualitativos e quantitativos na seara da grafotécnica. A partir disso, ficou definid que a grafotécnica deve observar elementos de ambas as naturezas, surgiu o método mais avançado até o momento: o Método Grafocinético.

Este método fora estabelecido precisamente no ano de 1927, no livro les lois de l’ecriture, pelo pai da grafotécnica moderna, Edmond Solange Pellat no qual formulou, como a tradução do título sugere, as leis da escrita.

Uma das maiores inovações no estabelecimento desse método é a necessidade do perito antes de iniciar os trabalhos deve tomar ciência da finalidade de sua contribuição. Além disso, o protagonista desse método é o movimento que dá origem ao gesto gráfico tendo os elementos subjetivos e objetivos analisados de maneira sistemática.

A análise pelo método grafocinético visa desvelar sobre o critério racional algumas questões como a) como os traços foram formados; b) Quais hábitos gráficos e tendência de punho possui o autor, sendo estes características próprias que individualizam o autor e c) Quais as causas determinantes de impulsos, ênfases e anomalias do gesto gráfico.

O método, portanto, aplicado nesta perícia foi o grafocinético, fundamentado nas quatro Leis do Grafismo de Solange Pellat, em especial na primeira lei, que considera a sucessão de movimentos determinados pelos impulsos cerebrais.

O autor Francês nos traz quatro conceitos básicos sobre o grafocinetismo. Assim, a consagrada na doutrina da grafoscopia denomina estes postulados como as “Leis do Grafismos”. Explicitamos:

  • 1ª Lei do Grafismo - O gesto gráfico está sob a influência direta do cérebro. Sua forma não é modificada pelo orgão escritor, caso este funcione normalmente e se encontre suficientemente adaptado á sua função.
  • 2ª Lei do Grafismo - Quando alguém escreve, o Eu está em ação, mas o sentimento quase inconsciente de que o Eu age passa por alternativas de intensidade e de enfraquecimento. Ele está em seu máximo de intensidade onde existe um esforço a fazer, isto é, nos inícios; e no mínimo, onde o movimento escritural é secundado pelo impulso adquirido, isto é, nas extremidades.
  • 3ª Lei do Grafismo - O grafismo natural não pode ser modificado voluntariamente, senão pela introdução no traçado de características do esforço despendido.
  • 4ª Lei do Grafismo - O escritor que age em circunstancia em que o ato de escrever é particularmente difícil, traça instintivamente as formas de letras que lhe são mais costumeiras, ou as mais simples, de esquema fácil de ser construído.

Em resumo, todos lançamentos gráficos que o ser humano executa são oriundos do cérebro e desempenhados de forma automatizada e inconsciente, restando aos demais membros do corpo humano apenas e tão somente interpretar os comandos cerebrais.

Nessa toada, de acordo com a segunda lei do grafismo, o ato de escrever é iniciado por um comando cerebral. Todavia, continua por instinto natural sem passar pela instância consciente.

O Gesto Gráfico, dessa forma, torna-se, uma criação única e de dificílima possibilidade de ser falsificado, sem que na falsificação apareçam marcas e evidencias da tentativa de fraude e a inclusão de características próprias do falsificador e não do titular do gesto gráfico.

Considerando a terceira lei preconizada por Pellat, acima transcrita, fica evidente que o simulador de alguma forma se trairá, seja através de paradas súbitas, desvios, quebras de direção, variações gráficas ou outros artificialismos, no decorrer da coleta de padrões. O esforço em escrever de forma consciente, então, quebra a espontaneidade. Deste modo, a dinâmica e a velocidade da escrita se tornam importantes elementos na identificação de uma fraude.

O escritor, de acordo com a quarta lei do grafismo, recorre a traços mais simples em situações limitadoras da escrita. Por exemplo, problemas com o instrumento gráfico, suporte inadequado ou movimento durante o lançamento tendem a adoção de traços menos complexos. A literatura dessa ciência traduz esta lei como “lei do menor esforço”, uma vez que uma lei em situação adversa, de forma não consciente opta por executar traços de menor complexidade.

Dito isso, é possível perceber o quanto o fator psicológico ostenta uma importância essencial, uma vez que em regra o sentimento de culpa e medo interfiram sobre o lançamento do grafismo, tendendo a mascarar as características pessoais. Poderá, nessas condições, ocorrer o abandono do gesto gráfico, comprometendo a qualidade das peças paradigmáticas, principalmente, se o indivíduo escritor tiver ciência das peças a serem analisadas.


4- Os Elementos Gráficos de Ordem Geral


Dentro do contexto de normas apregoada pela doutrina clássica da grafoscopia, o perito grafotécnico irá se ater a elementos, que a doutrina de Falat (2002), no qual são divididos em objetivos e subjetivos. Os elementos subjetivos são os elementos que são quase impossíveis de serem imitados, como habilidade, dinamismo, ritmo e escrita. Demanda um esforço maior do perito na sua identificação.

Diga-se que o expediente fraudulento do disfarce gráfico fica evidenciado pelo artificialismo, costumeiramente representado por variações nos Elementos de Ordem Geral (EOG) subjetivos, sendo estes “muito difíceis de serem simulados ou maquiados, pois são involuntárias” (TIROTTI, 2021 p.45) são deniminados como ritmo, dinamismo, velocidade e habilidade.

Outra natureza dos EOGs, temos elementos os objetivos que, por sua vez, podem ser classificados em genéricos e genéticos. São de fácil constatação e fácil reprodução. A Diferença entre os elementos genéricos e genéticos, explica Pretti (2017), é que aqueles são mais evidentes do que estes. São denominados como genéricos o calibre, a inclinação, o comportamento de pauta e valores angulares e curvilíneos. Enquanto os elementos genéticos, de elevada dificuldade de reprodução, são denomiados por pressão, evolução, ataques, desenvolvimento, ligações, remates e momentos gráficos.

Para endossar a acurácia e a higidez e sobretudo um resultado conclusivo neste trabalho, em relação aos padrões de confronto, é imprescindível observar determinadas condições da peça de confronto, tais como: adequabilidade, contemporaneidade, quantidade e autenticidade.

Os padrões de confronto variam conforme o caso concreto. Podem ser utilizados documentos anteriormente firmados, cartões de autógrados disponibilizados por oficiais de tabelionato ou até mesmo, o que é bem comum e possui uma elevada segurança, a produção de um auto de coletas de material caligráfico produzido em diligência pelo próprio perito ou por terceiro autorizad de confiança.

Del Picha (2016, p.424) leciona que o método grafocinético é o mais avançado e o mais completo método dentro da ciência da grafoscopia asseverando que:

Hoje, a grafoscopia tem seu método próprio, denominado “grafocinético”, termo que acabamos por proferir às genéricas denominações anteriores, “método grafotécnico ou grafoscópico”.

Resultou de um estudo aprofundado do grafismo, tendo em vista não só os diversos processos de fraude gráfica, como as causas provocadas de variações. Não se assenta em característicos isolados, como o morfológico (forma dos caracteres), o grafológico (qualidades subjetivas), o grafométrico (medições) o sinalético (“connietati e “contrasegni”), ou caligráfico (forma ou talhe).

Ao contrário, considera todos os elementos dando-lhes valor consoante o raciocínio pericial. E este processara sob critério lógico derivado do profundo estudo das diversas maneiras de produção gráfica.

Por fim, cabe frisar que todos os aspectos quando examinados em conjunto, qualitativamente, levam o perito grafotécnico a solução dos quesitos suscitados entre as partes. O Laudo Pericial Grafotécnico, peça única e individualizada que passa, pois, a ser prova no processo judicial.


Perito grafotécnico em Fortaleza - ajfalcaopericias.com

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