Analisando "Faraó: Divindade do Egito" – História e Mitologia na Música

 A música "Faraó: Divindade do Egito", lançada pelo grupo baiano Olodum em 1987, é uma das canções mais icônicas do samba-reggae e traz uma forte inspiração na mitologia egípcia. Neste artigo, vamos dissecar a letra e entender como a cultura do Antigo Egito é representada nos versos da canção. A análise será focada na primeira parte da letra, destacando conceitos históricos e mitológicos.

1. O Universo e a Criação Egípcia

O trecho inicial da música apresenta uma visão sobre a criação do universo segundo a mitologia egípcia:

"Deus e divindade infinita do universo
Predominante esquema mitológico
A ênfase do espírito original
Formará no Éden o ovo cósmico"

A ideia de um “ovo cósmico” remete à mitologia heliopolitana, na qual a criação do mundo começa a partir de uma massa primordial, chamada Nun. Dela surge Atum, a divindade criadora, que gera os primeiros deuses Shu (ar) e Tefnut (umidade). O conceito de um ovo cósmico também aparece em outras mitologias ao redor do mundo, como na mitologia hindu e grega.

O termo "Éden" aqui pode ser interpretado como uma adaptação poética para representar o paraíso primitivo onde tudo começou. Embora o Éden seja uma referência judaico-cristã, a associação pode indicar a perfeição e a origem divina do universo segundo as crenças egípcias.

2. O Mistério da Criação

A música continua com o seguinte verso:

"A emersão nem Osíris sabe como aconteceu
A emersão nem Osíris sabe como aconteceu"

A palavra "emersão" pode estar ligada à criação do mundo a partir do caos primordial. Segundo a crença egípcia, a terra (representada pelo deus Geb) emergiu das águas do Nun, dando origem ao mundo físico. Esse processo era misterioso, mesmo para os próprios deuses, reforçando a noção de que a criação era um evento divino e incompreensível.

3. O Olho de Hórus e a Ordem Cósmica

"A ordem ou submissão do olho seu
Transformou-se na verdadeira humanidade"

O "olho seu" faz referência ao Olho de Hórus, um dos símbolos mais importantes da cultura egípcia. Representava poder, proteção e restauração. O mito do Olho de Hórus está ligado à luta entre Hórus e Seth pelo trono do Egito, onde Hórus perde um de seus olhos e depois o recupera com a ajuda do deus Toth.

A relação do Olho de Hórus com a humanidade pode estar na ideia de ordem e justiça. No Egito Antigo, o conceito de Ma'at (verdade, justiça e harmonia) era essencial para o funcionamento da sociedade e representava a ordem cósmica estabelecida pelos deuses.

4. O Mito de Osíris

"Epopéia do código de Gerbi
E Nuti gerou as estrelas
Osíris proclamou matrimônio com Ísis
E o mal Seth, irado o assassinou"

Osíris, Ísis, Seth e Hórus formam um dos mitos mais importantes do Egito Antigo. Osíris era o deus da vegetação e da vida após a morte. Ele governava o Egito ao lado de Ísis, sua esposa, até que foi traído por seu irmão Seth, que o assassinou por inveja e desejo de poder.

A referência a "Nuti gerou as estrelas" menciona Nut, a deusa do céu, que dava à luz as estrelas e também era mãe de Osíris, Seth, Ísis e Néftis. O "código de Gerbi" pode ser uma referência simbólica ou poética à tradição egípcia.

5. Hórus e a Vingança de Osíris

"E ele terá
Hórus levando avante a vingança do pai
Derrotando o império do mal Seth
O grito da vitória que nos satisfaz"

Após a morte de Osíris, seu filho Hórus busca vingança contra Seth. Essa batalha representava a luta entre o bem e o mal e a disputa pelo trono do Egito. No final, Hórus derrota Seth e se torna o novo governante, restaurando a ordem no Egito.

A vitória de Hórus simboliza a restauração da justiça e do equilíbrio no universo, reforçando o papel dos faraós, que eram considerados sucessores diretos de Hórus na Terra.


Conclusão

A música "Faraó: Divindade do Egito" não apenas celebra a riqueza cultural do Antigo Egito, mas também traduz, de maneira poética e envolvente, mitos fundamentais dessa civilização. O uso de elementos como a criação do mundo, o Olho de Hórus e a vingança de Osíris mostra como a história e a mitologia egípcia continuam fascinando e influenciando a cultura popular.

Para os estudantes de história, essa análise permite perceber como a música pode ser uma ferramenta poderosa para aprender sobre civilizações antigas, tornando o estudo mais acessível e dinâmico. Assim, a letra da canção do Olodum se torna não apenas um sucesso musical, mas também uma aula sobre um dos impérios mais fascinantes da antiguidade.

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